PARECERES TECNICOS

sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Autenticação, certificação e reconhecimento de assinaturas

PARECER PUBLICADO NO SITE DA ORDEM DOS ADVOGADOS

12-02-2007

Processo nº E-13/06

PARECER

O Conselho Geral da Ordem dos Advogados, por deliberação tomada em reunião de 19 de Outubro de 2006, solicitou-lhe a emissão de parecer sobre a autenticação, certificação e reconhecimento de assinaturas praticado por advogado — âmbito e formalidades face ao disposto no Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29 de Maio.

Cumpre apreciar.

A matéria do reconhecimento de assinaturas e autenticação e tradução de documentos ocupa o Capítulo III do Decreto-Lei nº 76-A/2006, de 29 de Maio, o qual é composto apenas por um artigo (o artigo 38º), o qual dispõe o seguinte:

Artigo 38º
Extensão do regime dos reconhecimentos de assinaturas e da autenticação e tradução de documentos

1. Sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades, as câmaras de comércio e indústria, reconhecidas nos termos do Decreto-Lei nº 244/92, de 29 de Outubro, os conservadores, os oficiais de registo, os advogados e os solicitadores podem fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, autenticar documentos particulares, certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos nos termos previstos na lei notarial.

2. Os reconhecimentos, as autenticações e as certificações efectuados pelas entidades previstas nos números anteriores conferem ao documento a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial.

3. Os actos referidos no nº1 apenas podem ser validamente praticados pelas câmaras de comércio e indústria, advogados e solicitadores mediante registo em sistema informático, cujo funcionamento, respectivos termos e custos associados são definidos por portaria do Ministro da Justiça.

4. Enquanto o sistema informático não estiver disponível, a obrigação de registo referida no número anterior não se aplica à prática dos actos previstos nos Decretos-Leis nºs 237/2001, de 30 de Agosto, e 28/2000, de 13 de Março.

5. O montante a cobrar, pelas entidades mencionadas no nº3, pela prestação dos serviços referidos no nº1, não pode exceder o valor resultante da tabela de honorários e encargos aplicável à actividade notarial exercida ao abrigo do Estatuto do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei nº 26/2004, de 4 de Fevereiro.

O registo no sistema informático previsto nesta disposição veio a ser implementado pela Portaria nº 657-B/2006, de 29 de Junho.

Verifica-se assim que aquela disposição passou a atribuir também aos advogados competências que anteriormente se encontravam exclusivamente reservadas aos notários, numa evolução que já vem desde 2000.

Efectivamente, o art. 1º, nº3, do Decreto-Lei 28/2000, de 13 de Março, atribuiu também aos advogados competência para certificar a conformidade de fotocópias com os originais que lhes sejam apresentados para esse fim, e proceder à extracção de fotocópias que lhes sejam presentes para certificação, adquirindo essas fotocópias o valor probatório dos originais.

Posteriormente, o art. 5º do Decreto-Lei 237/2001, de 30 de Agosto atribuiu ainda aos advogados competência para fazer reconhecimentos com menções especiais por semelhança, nos termos previstos no Código do Notariado, e certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos, acrescentando o art. 6º que os reconhecimentos e traduções efectuados nestes termos conferem aos documentos a mesma força probatória que teria se tais actos tivessem sido realizados com intervenção notarial.

Confrontando o art. 38º do D.L. 76-A/2006, de 29 de Março, verifica-se que o seu carácter inovatório consiste em ter atribuído aos advogados competência para fazer reconhecimentos de quaisquer espécie, simples e com menções especiais, presenciais e por semelhança, bem como para a autenticação de documentos particulares, uma vez que anteriormente já lhe tinham sido atribuídas outras competências notariais.

As competências notariais agora igualmente atribuídas aos advogados correspondem assim ao seguinte:
a) certificar a conformidade de fotocópias com os documentos originais apresentados e proceder à extracção das mesmas para esse efeito.
b) fazer reconhecimentos simples e com menções especiais, presenciais ou por semelhança;
c) autenticar documentos particulares,
d) certificar, ou fazer e certificar, traduções de documentos.

Estas competências abrangem precisamente as competências anteriormente reservadas aos notários no art. 4º, nº2, c), f) e parcialmente na alínea g) do Código do Notariado.

Examinemos sucessivamente estas competências.

Em relação à certificação de fotocópias ela abrange a conferência de fotocópias, prevista no art. 171º-A do Código do Notariado, mas não os certificados, referidos nos arts. 161º e ss. CN, nem as certidões extraídas dos instrumentos, registos e documentos arquivados nos cartórios. Efectivamente, aos advogados não foram atribuídas as competências notariais previstas nas alíneas d) e e), nem a da primeira parte da alínea g) do art. 4º CN, pelo que não podem certificar factos que tenham verificado, nem passar certidões de documentos em relação a um arquivo que organizem, uma vez que a lei não lhes atribuiu essas funções notariais. Através da certificação de fotocópias, os advogados conferem às mesmas a mesma força probatória resultante do documento original.

Em relação à feitura dos reconhecimentos, destina-se a mesma a atribuir aos documentos a eficácia e força probatória estabelecida nos arts. 374º a 376º do Código Civil, que anteriormente estava dependente de intervenção notarial.

Conforme se salientou, após o D.L. 76-A/2006, de 29 de Março, todo e qualquer reconhecimento pode agora vir a ser feito pelo advogado, independentemente de ser simples ou com menções especiais, presencial ou por semelhança, desde que sejam cumpridos os requisitos previstos nos arts. 153º e ss., do Código do Notariado e realizado o registo informático previsto na Portaria 657-B/2006, de 29 de Junho.

Em relação à autenticação de documentos particulares, trata-se da competência anteriormente atribuída ao notário pelo art. 363º, nº3, do Código Civil, que permite atribuir ao documento, nos termos do art. 377º do mesmo Código “a força probatória dos documentos autênticos, ainda que não os substituam quando a lei exija documento desta natureza para a validade do acto”. O processo de autenticação dos documentos particulares encontra-se disciplinado nos arts. 150º e ss. do Código do Notariado, exigindo-se assim que as partes confirmem o seu conteúdo perante o advogado (art. 150º, nº1, CN), o qual deve lavrar termo de autenticação (art. 150º, nº2, CN), o qual obedece aos requisitos previstos nos arts. 150º e 151º CN, devendo ainda ser efectuado o registo informático previsto na Portaria 657-B/2006, de 29 de Junho. Finalmente, compete ao advogado certificar, ou fazer e certificar, traduções, as quais devem obedecer aos requisitos previstos nos arts. 172º e ss., do Código do Notariado, cabendo-lhe também fazer o registo destes actos no referido sistema informático.

Podem suscitar-se algumas dúvidas em relação a certo tipo de actos. Assim, por exemplo, quanto ao reconhecimento presencial das assinaturas no contrato-promessa, previsto no art. 410º, nº3, CC, embora o mesmo possa ser feito por advogado, a verdade é que a lei exige concomitantemente a certificação pelo notário da licença de utilização ou de construção, e a competência para essa certificação não foi atribuída a advogados.

O reconhecimento pelos advogados das assinaturas nos contratos-promessa suscita igualmente problemas quando a tradição da coisa determina que ocorra um facto constitutivo da liquidação do IMT, parecendo que neste caso será aplicável aos advogados a disposição do art. 49º, nº1, do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, não podendo estes efectuar o reconhecimento sem que lhes seja exibida declaração prevista no art. 19º CIMT, acompanhada do respectivo documento de cobrança, que arquivarão, disso fazendo menção no documento a que respeitam, sempre que a liquidação deva preceder a transmissão(1) .

Já em relação às procurações, nos termos do art. 116º, nº1, CN as mesmas podem ser lavradas por instrumento público, documento escrito e assinado pelo representado com reconhecimento de letra e assinatura ou por documento autenticado. Assim, os advogados podem validar procurações através do reconhecimento de letra e de assinatura ou da autenticação do documento por termo, uma vez que essas competências lhes foram atribuídas. Apenas não podem lavrar procurações por instrumento público, dado que esta é uma competência estritamente notarial. Consequentemente, não poderão os advogados validar procurações conferidas também no interesse do procurador ou de terceiro, uma vez que estas devem ser necessariamente lavradas por instrumento público, cujo original é necessariamente arquivado no cartório notarial (art. 116º, nº 2, CN).

Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.
Lisboa, 7 de Janeiro de 2007
O Vice-Presidente do CDLLuís Menezes Leitão

Notas:1- Neste sentido, cfr. PEDRO MORÃO CORREIA, “Da obrigação de cooperação e fiscalização dos advogados relativamente ao pagamento de IMT”, em Boletim da Ordem dos Advogados nº 43 (Setembro-Outubro 2006), pp. 24-27.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

ORÇAMENTO DO ESTADO PARA O ANO DE 2007

A Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 - http://dre.pt/pdf1sdip/2006/12/24901/00020379.PDF - que aprovou o Orçamento do Estado para o ano de 2007, introduziu alterações, a vários diplomas.

De entre elas, salientamos as seguintes
:

· IRS: Artigos 28.º, 31.º, 31.º-A, 45.º, 53.º, 54.º, 65.º, 68.º, 70.º, 72.º, 76.º, 77.º, 78.º, 79.º, 82.º, 84.º, 85.º, 86.º, 96.º, 7.º, 100.º e 103.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 42/91, de 22 de Janeiro;
· IRC: Artigos 14.º, 34.º, 40.º, 46.º, 49.º, 63.º, 73.º, 86.º, 89.º, 90.º, 98.º, 110.º e 129.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 35/2005, de 17 de Fevereiro;
· IVA: Artigos 27.º, 39.º, 60.º e 71.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e verba 2.21 da lista I anexa ao Código do IVA;
· Imposto de Selo: Artigos 3.º e 33.º do Código do Imposto do Selo;
· IMI: artigos 33.º, 39.º, 40.º, 41.º, 43.º, 44.º, 62.º e 112.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis;
· IMT: Artigos 6.º, 8.º, 9.º, 10.º, 15.º e 17.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis;
· Benefícios Fiscais: artigos 14.º, 17.º, 21.º, 22.º-A, 40.º, 40.º-A, 42.º, 46.º e 56.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais;
· Lei Geral Tributária: artigos 14.º, 45.º, 49.º, 60.º e 89.º-A da lei geral tributária;
· CPPT: artigos 39.º, 73.º, 163.º, 189.º, 195.º, 196.º, 219.º, 235.º, 240.º, 250.º e 251.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
· RGIT: artigos 26.º, 28.º, 41.º, 47.º, 52.º, 70.º, 73.º, 75.º, 78.º, 105.º, 108.º, 109.º e 110.º do Regime Geral das Infracções Tributárias.

OBS:
Chama-se especial atenção para as alterações ao IMT, designadamente para aquela que se prende com a aquisição de imóveis ou fracções autónomas destinados a habitação mas não à habitação própria e permanente do sujeito passivo.

FR



segunda-feira, setembro 04, 2006

RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO SOLICITADOR

PARECER EMITIDO PELA DIRECÇÃO- GERAL DOS IMPOSTOS A PEDIDO DO Conselho Regional do Norte da Câmara dos Solicitadores sobre a seguinte questão:

“É o Solicitador, na qualidade de mandatário e no exercício dessas funções, responsável solidariamente pelo pagamento das contribuições e impostos dos residentes e não residentes território Português?”.

Por determinação do Senhor Director-Geral, veio a questão remetida a esta Direcção de Serviços para parecer.

A Câmara apresenta como pressupostos para a sua questão o facto de o Solicitador ser um mandatário que pratica actos por conta de outrem e de que apenas carece de procuração para a prática de actos judiciais.

Assim, pretende-se saber qual a responsabilidade fiscal do Solicitador nos casos de mandato tributário e mandato judicial, nos casos de representação fiscal de residentes e de não residentes e nos casos em que intervém como gestor de negócios.


Sujeito passivo da relação tributária e capacidade tributária de exercício

1 – o sujeito passivo da relação tributária, segundo o nº 3, do artº. 18º, da Lei Geral Tributária (LGT), é “a pessoa singular colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte de facto, substituto ou responsável”.

Decorre da lei que, quem estiver de posse plena da sua capacidade jurídico-tributária de exercício (artº. 16º da LGT), pode realizar pessoal e directamente os actos que lhe sejam admitidos ou pode fazer-se representar, confiando a outrem a realização de todos os actos que não tenham carácter pessoal.

Para quem não estiver de posse dessa faculdade, como é o caso de menores, interditos ou inabilitados, que não dispõem de capacidade de exercício, a prática dos actos é assegurada pelos representantes legais – pais tutores ou curadores e pelas pessoas que administrem os seus interesses.

Mas “os actos em matéria tributária que não sejam de natureza puramente pessoal podem ser praticados por gestor de negócios , produzindo efeitos em relação ao dono do negócio nos termos da lei civil” (1) (artº. 17º, nº 1 da L.G.T.), caso em estaremos perante a gestão de negócios quando os actos forem praticados para além dos poderes que lhe forem conferidos.



O exercício por terceiros. A representação

2 – Nesta conformidade, como ficou dito, quem estiver de posse plena da sua capacidade jurídico-tributária de exercício pode realizar pessoal e directamente os actos que lhe sejam admitidos, mas também pode fazer-se representar, confiando a outrem a realização dos actos que não tenham carácter estritamente pessoal.

E em regra, os actos serão realizados pelo próprio sujeito passivo que poderá optar por outro comportamento e entregar essa tarefa a terceiro, mas também pode ser a lei a impô-lo, em certas circunstâncias.

No primeiro caso estamos perante a representação voluntária que é conferida através de mandato tributário, (artº. 5 do CPPT) “isto é, mandato conferido pela prática de actos que se inserem no desenvolvimento de uma relação jurídico-tributária” (2).

Esta forma de representação legal não é exclusiva destes incapazes.

Descortinamos o mesmo tipo de representação nos casos do exercício dos direitos e deveres de não residentes, tanto em relação a pessoas singulares como em relação a pessoas colectivas (artº. 130º do CIRS e artº. 118º do CIRC, respectivamente), em que se prevê que os actos sejam obrigatoriamente praticados por um representante,

E o mesmo sucede em determinados actos judiciais em que a representação também resulta de imposição legal, como é o caso do mandato judicial, ou seja, é obrigatória a constituição de advogado nas causas judiciais cujo valor exceda o décuplo da alçada do tribunal administrativo fiscal de 1ª instância, bem como em todos os processos de competência do TCA ou do STA (artº. 6º do CPPT).

3 – Do que se trata na presente consulta é de saber qual a posição do solicitador em face da relação tributária, enquanto mandatário do sujeito passivo ou do seu representante, isto porque nos casos da representação legal é o representante quem pode conferir o mandato.

Nos termos do nº 1 do artº. 5º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), os interessados ou os representantes legais podem conferir mandato, sob a forma prevista na lei, para a prática de actos de natureza procedimental ou processual tributária que não tenham carácter pessoal.

O nº 2 deste artigo, por sua vez, acrescenta que, sempre se discutam ou suscitem questões de direito perante a administração tributária, em quaisquer petições, reclamações ou recursos, o mandato-tributário só pode ser exercido, nos termos da lei, por advogados, advogados estagiários e solicitadores.



O mandato é o contrato segundo o qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos por conta da outra (artº. 1157º do Código Civil). A lei presume que o mandato é gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão. No caso dos solicitadores, portanto, o mandato presume-se oneroso, isto é, o solicitador recebe honorários para praticar determinados actos por conta do cliente.

Por natureza, o mandatário actua por conta do mandante e não haverá mandato se alguém se obriga a realizar com terceiro, por sua conta, um negócio jurídico.

Os actos em matéria tributária praticados por representante em nome do representado produzem efeitos na esfera jurídica deste, nos limites dos poderes de representação que lhe forem conferidos por lei ou por mandato (artº. 16º, nº 1 da L.G.T.). (3)

Logo. O mandato não confere, em regra, qualquer responsabilidade nem solidária nem subsidiária ao mandatário pelo pagamento do imposto, mesmo que a sua nomeação seja obrigatória, porque ele realiza actos em nome e por conta do mandante, na esfera jurídica do qual se produzem os efeitos dos actos praticados. Porém, há situações de excepção, como é o caso, de entre outras, do artº. 29º do Código do IVA (CIVA) e do artº. 24º do Regime de IVA nas Transacções Internacionais (RITI), relativamente a operações sujeitas a imposto praticadas por não residentes.

A lei civil prevê também, como vimos, que o mandatário possa ser responsabilizado perante o mandante, mas poderá ter ainda responsabilidade própria de natureza criminal ou contra-ordenacional, nos termos do artº. 6º do Regime Geral das infracções tributárias (RGIT).

A responsabilidade tributária

4 – Como refere a doutrina, o responsável tributário só é chamado ao pagamento do imposto quando o devedor originário (incluindo para tais efeitos, o substituto) o não pagou oportunamente, e, em processo de execução fiscal, se tenha apurado a inexistência ou a fundada insuficiência de bens penhoráveis daquele devedor originário. (4)

Assim, a responsabilidade é efectivada no processo de execução fiscal, através da reversão, quando verificados os requisitos do artº. 23º da LGT e artº. 153º do CPPT.

4.1 – Como atrás foi referido, o Solicitador, enquanto mandatário, e sem prejuízo dos casos já mencionados, não é nem responsável solidário nem subsidiário, com o mandante, pelo pagamento da dívida de imposto, sem prejuízo de poder ser responsável por contra-ordenações ou crimes fiscais nos termos também já referidos.


Não importa para esta conclusão tratar-se de mandato tributário ou mandato judicial.

4.2 – Nos casos de representação de residentes ou não residentes, aplicar-se-ão as regras gerais, isto é, se o solicitador intervém na qualidade de mandatário seguem-se as conclusões acabadas de mencionar, com as especificidades referentes aos representantes de não residentes, conforme os procedimentos previstos na lei, isto é, o solicitador será responsável pelo cumprimento de todas as obrigações fiscais, quando a lei assim o determinar (artº. 29º do CIVA e 24º do RITI).

Importante nesta matéria é ainda o artº. 27º da LGT que estabelece “1 – Os gestores de bens ou direitos de não residentes sem estabelecimento estável em território português são solidariamente responsáveis em relação a estes e entre si por todas as contribuições e impostos do não residente relativos ao exercício do seu cargo. 2 – Para efeitos do presente artigo, consideram-se gestores de bens ou direitos todas aquelas pessoas singulares ou colectivas que assumam ou sejam incumbidas, por qualquer meio, da direcção de negócios de entidade não residente em território português, agindo no interesse e por conta dessa entidade. 3 – O representante fiscal do não residente, quando pessoa diferente do gestor dos bens ou direitos, deve obter a identificação deste e apresentá-la á administração tributária, bem como informar no caso da sua inexistência, presumindo-se, salvo prova em contrário, gestor de bens ou direitos na falta destas informações”.

4.3 – Para a situação de gestor de negócios, como ficou expresso, os actos tributários que não sejam de natureza estritamente pessoal podem ser praticados por gestor de negócios, produzindo efeitos em relação ao dono do negócio nos termos da lei civil. (5)

Os actos praticados por gestor de negócios reflectem-se na esfera jurídica do gestido se a gestão for ratificada, mas que se presume ratificada, nos casos de pagamento e de cumprimento de obrigações acessórias, após o decurso do respectivo prazo do seu cumprimento (nº 3 do artº. 17º da LGT)

Todavia, enquanto a gestão não for ratificada, o gestor assume todos os direitos e deveres do sujeito passivo da relação tributária (nº 2 do artº. 17º da LGT).

4.4 – Caso o solicitador intervenha nas relações fiscais investido de qualquer das qualidades referidas no artº. 24º da L.G.T., então a questão passará a ser analisada nos termos do ofício-Circulado nº 60043/2005, de 25 de Janeiro da DSJT, como qualquer membro de Órgão Social, já que será nessa qualidade que se analisará a sua responsabilidade e não enquanto solicitador.


4.5 - Acresce, como se mencionou atrás, a possibilidade de existir responsabilidade criminal ou contra-ordenacional de conformidade com o que vem previsto no artº. 6º do RGIT, nas actuações em nome de outrem.

Lisboa, 2006-03-23


O Consultor Jurídico - José Ramos Alexandre

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(1) – artº. 464º a 472º do Código Civil
(2) – o “DireitoFisca” de Soares Martinez, pag. 256l
(3) – no mesmo sentido o artº. 258º do Código Civil
(4) – Vide, “Direito Fiscal” de Soares Martinez, pag. 251
(5) Vide artº 464º e seguintes do Código Civil.



sexta-feira, junho 09, 2006

SEGREDO PROFISSIONAL

O Solicitador tem, através da sua ampla intervenção na área extrajudicial, conhecimento de vários factos através:
- da revelação pelo próprio cliente;
- das buscas necessárias para obter elementos para instruir os processos;
- das diligências decorrentes de tentativas de conciliação.

Com certeza que mais tarde ou mais cedo, irá deparar com uma notificação para, como testemunha, revelar factos, dos quais teve conhecimento no exercício da profissão.


Que fazer ?

O Solicitador deve escusar-se a violar o Segredo Profissional, para não quebrar a relação de confiança constituída entre si e o seu cliente. A não ser que, a revelação seja no próprio interesse do cliente e com a sua autorização, tendo sempre presente o disposto no nº3 do artigo 110º: “...Cessa a obrigação do segredo profissional em tudo quanto seja absolutamente necessário à defesa da dignidade, direitos e interesses legítimos do solicitador, do cliente ou seus representantes, mediante prévia autorização do presidente do conselho regional.. ...”

No entanto, o solicitador pode sempre recusar-se à revelação, mesmo com a autorização do cliente.

Pode-se afirmar que, em caso de dúvida, o melhor conselho que se pode dar é o de limitar o mais possível a revelação.

Mesmo que haja depoimento, sem a respectiva autorização do Presidente Regional , o mesmo não pode fazer prova, como também fica o Solicitador sujeito a procedimento disciplinar pela quebra do Segredo Profissional.
Tal pode consubstanciar-se na participação das partes ao Conselho Regional da área em que o Colega está inscrito, como na participação pelo próprio Tribunal.

COMO SE EFECTUA O PEDIDO DE DISPENSA

O primeiro passo a dar é a obtenção da autorização do cliente desvinculando o Solicitador do segredo profissional.

O PEDIDO de dispensa do segredo profissional é dirigido ao Presidente Regional respectivo, salvo se for membro de órgão Nacional, Regional ou do Colégio da Especialidade, nestes casos o pedido é dirigido ao Presidente da Câmara dos Solicitadores.

Deve ser exposto de forma clara, conciso e fundamentando a sua necessidade, juntando cópia das peças processuais, de forma a facilitar a decisão a tomar.

Igualmente deverá anexar a declaração do cliente concordando com a dispensa.

O empregado do Solicitador está abrangido ?

O empregado do Solicitador também está abrangido pelo segredo profissional, no que respeita a factos que tomou conhecimento no escritório e no exercício daquelas funções, através do seu vinculo laboral. No entanto, pode o mesmo ser quebrado, se pelo Solicitador for instado ou se lhe for determinado por decisão judicial especifica para quebrar o sigilo.
Doutro modo, estariam quebrados os princípios de relação de confiança constituída entre o Solicitador (ao qual lhe estão subordinados os serviços administrativos e os seus colaboradores) e o cliente.

O Tribunal que julga a acção não tem competência para dispensar o Solicitador - artº519 do C.P.C. e art.135 do C.P.P.

Concluindo o Tribunal que não há fundamento para a escusa, ou havendo legitimidade na mesma, mas tornando-se essencial para o tribunal a quebra do segredo, este ao abrigo do principio da prevalência do interesse preponderante, requer ao tribunal imediatamente superior que ordene a prestação de depoimento, sendo sempre ouvida a Câmara dos Solicitadores.

NÃO ESTÁ SUJEITO AO SEGREDO PROFISSIONAL

Deve excluir-se do âmbito do segredo profissional factos notórios, factos de domínio público, factos revelados pelas partes, factos revelados em juízo, documentos autênticos ou autenticados.

VIOLAÇÃO DO SEGREDO PROFISSIONAL

Incorre em ilícito disciplinar o Solicitador que revele segredos do cliente, tendo tido conhecimento deles no exercício da profissão, sem que tenha obtido a prévia autorização do Presidente Regional respectivo.

CRIME – ARTIGO 195º, CÓDIGO PENAL

O Solicitador que, sem consentimento do Cliente e sem a autorização do Presidente Regional respectivo, revelar factos conhecidos através do exercício da profissão, incorre no crime previsto e punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 240 dias.

RESPONSABILIDADE CIVIL – ARTIGO 483º, CÓDIGO CIVIL
Provando-se a culpa e a existência de um dano ou prejuízo para o cliente, e deste modo passível de ser integrado no disposto no artigo 483º, do Código Civil. Pode o Solicitador ficar obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação do segredo profissional.


Texto da responsabilidade de AM


terça-feira, junho 06, 2006

PEDIDOS DE CERTIDÕES DE TELAS FINAIS POR SOLICITADORES, SEM NECESSIDADE DE EXIBIR PROCURAÇÃO

PELO INTERESSE E ACTUALIDADE CITAMOS TRECHOS DO OFICIO REMETIDO POR ESTE CONSELHO REGIONAL DO NORTE A UMA CÂMARA MUNICIPAL, A PROPÓSITO DA RECUSA DOS SEUS SERVIÇOS DE PLANEAMENTO E GESTÃO URBANISTICA EM EMITIR CERTIDÕES DE TELAS FINAIS AOS SOLICITADORES QUE NÃO EXIBAM PROCURAÇÃO.





Exmº Senhor
Presidente da Câmara Municipal de ….

C/C Exmº Senhor Presidente da Associação
de Municípios Portugueses

Ofício nº. …..

ASSUNTO: PEDIDOS DE CERTIDÕES DE TELAS FINAIS POR SOLICITADORES, SEM NECESSIDADE DE EXIBIR PROCURAÇÃO.

Porto, 2006, .…, 00

Exmº Senhor Presidente,

Na sequência do oficio nº ……, de … de … p.p. e recebido em … do corrente mês, permita-nos trazer à consideração de V.Exª , a fim de tomar as decisões que achar por mais adequadas, sendo certo o seguinte:

a) A……, Solicitador com Cédula Profissional ……, e escritório na Rua….., na Comarca de ……., requereu por escrito, em ….., na ….. da Câmara Municipal de ………, o fornecimento de cópia de telas finais de projecto de arquitectura para a inscrição de parcela de terreno para construção urbana, telas essas referentes ao processo de licenciamento de obras particulares n.º …… – ……., para dar cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 37.º do CIMI.

b) Na mesma data, requereu, igualmente por escrito, junto do mencionado departamento, cópia de telas finais para efeitos de inscrição de prédio urbano,
relativas ao processo 00000000, para dar cumprimento à disposição legal já referida.
c) Por ofícios datados de ………. remetidos pela Divisão de Planeamento e Gestão Urbanística do Município de …………….., recebeu a informação que os processos em causa estavam em curso, pelo que qualquer elemento relativo aos mesmos apenas deveria ser fornecido ao seu titular ou a quem estivesse mandato para o efeito; acrescentando ainda que “de acordo com o Estatuto dos Solicitadores estes podem consultar processos, sem exibir a respectiva procuração, requerer elementos por escrito ou verbalmente, desde que estes não tenham carácter reservado”.

d) Os referidos ofícios terminam concluindo “Uma vez que o processo em causa se encontra em curso, consideramos que deverá comprovar que se encontra mandatado para requerer os elementos pretendidos.”

e) Nesta sequência, o solicitador solicitou ao Presidente do Conselho Regional do Norte da Câmara dos Solicitadores todas as diligências possíveis junto da Câmara Municipal de ………. no sentido de alterar a prática apresentada, por a mesma estar inquinada de ilegalidade e por obstruir o livre exercício da profissão de Solicitador.

f) Em resposta a esta solicitação, o Conselho Regional do Norte da Câmara dos Solicitadores, por oficio n.º 00000/2006, manifestou a sua concordância com a posição assumida pelo solicitador na questão apresentada, informando que iria transmitir à Câmara Municipal de ………. a opinião que os processos relativos a prédios não revestem natureza sigilosa, nem tão pouco a nível
fiscal, dada a natureza pública do registo predial, o que se verificou com a remessa do ofício n.º 0000/2006 ao Presidente da Câmara Municipal de … .

g) No seguimento do ofício n.º 000000/2006 referido, a Divisão de Planeamento e Gestão Urbanística do Município de …….., por ofício de 00 de ….l de 2006, informou o Conselho Regional Norte da Câmara dos Solicitadores que “As telas finais para efeitos de IMI, fornecidas pelas Câmaras Municipais, não são certidões mas sim cópias autenticadas do projecto aprovado.
“De acordo como o disposto no artigo 100º do DL 88/2003 de 26 de Abril, os solicitadores podem requerer em qualquer serviço público o exame de processos, livros ou documentos que não tenham carácter reservado ou secreto sem necessidade de exibir procuração.
“Os projectos em curso são documentos reservados pelo que as cópias dos mesmos são apenas fornecidas aos solicitadores quando estes comprovem estar mandatados pelo proprietário”.
Considerando que no artigo 100.º do Estatuto da Câmara dos Solicitadores – aprovado pelo Dec.Lei nº88/2003, de 26/4 dispõe:
“Artigo 100.º
Direitos dos solicitadores
“1 - Os solicitadores podem, no exercício da sua profissão, requerer, por escrito ou oralmente, em qualquer tribunal ou serviço público, o exame de processos, livros ou documentos que não tenham carácter reservado ou secreto, bem como a passagem de certidões, sem necessidade de exibir procuração.

“2 - A recusa do exame ou da certidão a que se refere o número anterior deve ser justificada imediatamente e por escrito.”

Afigurando-se como o cerne da problemática suscitada o esclarecimento dos conceitos de reservado ou secreto e limitando a questão ao domínio administrativo (colocando de parte, portanto, outros domínios como sejam o do processo civil ou penal), devemos desde logo atender ao disposto nº 2 do artigo 268º da Constituição, que consagra:
“Os cidadãos têm também o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas.”
Em anotação desta disposição, escrevem J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA :”Com as ressalvas legais em matérias de segurança interna e externa, investigação criminal e intimidade das pessoas (nº 2, in fine), a Constituição torna claro que a liberdade de acesso é a regra, sendo os registos e arquivos um património aberto da colectividade. A fórmula «arquivos e registos administrativos: deve entender-se em sentido amplo, considerando-se como tais os dossiers, relatórios, directivas, instruções, circulares, notas, estudos, estatísticas. O acesso exercer-se-á através da consulta (em princípio gratuita) no local onde se guarda o arquivo ou registo, observando-se, como é óbvio, as normas e regras técnicas relativas à preservação do documento. O direito de acesso inclui também o direito à reprodução do documento (fotocópia, microfilme, etc.), desde que tal não danifique o documento.

O direito de acesso aos arquivos e registos administrativos pode estar em conflito com bens constitucionalmente protegidos (segurança interna e externa, investigação criminal e intimidade das pessoas).

A restrição constitucionalmente autorizada, por essas razões, ao direito de acesso aos documentos administrativos não dispensa a lei da observância dos princípios jurídico-constitucionais materialmente informadores de toda a actividade administrativa (necessidade, adequação, proporcionalidade)”.

No mesmo sentido, escreveu-se no acórdão nº 394/93, de 16 de Junho de 1993, do Tribunal Constitucional:
“Assim, partindo-se da ideia de que o direito à informação constitucionalmente consagrado não é um direito absoluto, mas comporta limitações, estas devem limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, com respeito pelos princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade.”

Seguindo o acórdão referido, podemos ainda acrescentar este direito de acesso aos registos e arquivos administrativos, consagrado no Diploma Fundamental, corresponde ao chamado «princípio do arquivo aberto (open file), ou princípio de administração aberta: que consiste no «reconhecimento a toda e qualquer pessoa do direito de acesso às informações constantes dos documentos, dossiers, arquivos e registos administrativos – mesmo que não se encontre em curso qualquer procedimento administrativo que lhes diga directamente respeito –, desde que elas não incidam sobre matérias
concernentes à segurança interna e externa, à investigação criminal, à intimidade das pessoas.
Este princípio da administração aberta tem consagração no artigo 65º do Código do Procedimento Administrativo – que, ao retomar o referido preceito constitucional, o citado nº 2 do artigo 268º, ainda refere que «mesmo que não se encontre em curso qualquer procedimento que lhes diga directamente respeito: -, e na Lei nº 65/93, de 26 de Agosto, que regula “o acesso dos cidadãos aos documentos administrativos”, de acordo com os «princípios da publicidade, da transparência, da igualdade, da justiça e da imparcialidade” (artigo 1º).Este diploma – Lei nº 65/93 – difere, quanto ao acesso, os documentos nominativos ( “quaisquer suportes de informação que contenham dados pessoais”, ou seja, “informações sobre pessoa singular, identificada ou identificável, que contenham apreciações, juízos de valor ou que sejam abrangidos pela reserva da intimidade da vida privada” - artigo 4º, nº 1, alíneas b) e c)) e documentos não nominativos (por exclusão de partes, os demais).

Depois de estabelecer que “os documentos que contenham informações cujo conhecimento seja avaliado como podendo pôr em risco ou causar dano à segurança interna e externa do Estado ficam sujeitos a interdição de acesso ou a acesso sob autorização [...]” (artigo 5º, nº 1), e que o “acesso a documentos referentes a matérias em segredo de justiça é regulado por legislação própria” (artigo 6º), o diploma dispõe nos artigos 7º e 8º:

Artigo 7º –
1.- Todos têm direito à informação mediante acesso a documentos administrativos de carácter não nominativo.
(…)”Artigo 8º –
(Acesso a documentos nominativos)
1 - Os documentos nominativos são comunicados, mediante prévio requerimento, à pessoa a quem os dados digam respeito, bem como a terceiros que daquela obtenham autorização escrita.
2 - Fora dos casos previstos no número anterior os documentos nominativos são ainda comunicados a terceiros que demonstrem interesse directo, pessoal e legítimo.
3 - A comunicação de dados de saúde, incluindo dados genéticos, ao respectivo titular faz-se por intermédio de médico por ele designado.”

Sintetizando o que até aqui foi dito, pode afirmar-se que em matéria relativa a elementos detidos pela Administração o princípio é o de livre acesso; porém, em determinadas áreas sensíveis vigora o princípio inverso. Deve-se no entanto entender que no caso não estamos perante nenhuma das excepções ao princípio, uma vez que a situação não se enquadra em nenhuma das matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas.



De facto, e considerando as telas finais como meras peças escritas e desenhadas que correspondem, exactamente, à obra executada, não se colocam quaisquer questões neste domínio, não havendo tão pouco uma limitação pessoal ao seu acesso uma vez que não se trata sequer de documentos de carácter nominativo.

Compreendida assim a questão, bem se entende o disposto noutras disposições legais, como o artigo 39.º 2 do CRP e o artigo 30.º 1 do CRC, quanto à desnecessidade de exibição de procuração para os actos de registo predial ou comercial requeridos por Advogados e Solicitadores.

Em face do exposto, cumpre dizer que no mínimo é inadmissível que um departamento dessa Câmara Municipal após tomar conhecimento do pedido da Câmara dos Solicitadores – Associação Pública - de verificação da legalidade da posição expressa relativa ao assunto em questão, tome a decisão de remeter o referido oficio nº 00000, sem qualquer fundamento jurídico.

Pelo que, Solicitamos ao Exmº Senhor Presidente que tome as providências necessárias para que seja reposta a legalidade de actuação por parte daqueles serviços, sob pena de recurso aos meios adequados para o efeito, o que realmente não é pretendido por este Conselho Regional.

Creia-nos Exmº Senhor Presidente na mais alta estima e consideração,

O Presidente Regional do Norte - Dr. Paulo Teixeira



quarta-feira, maio 03, 2006

INSCRIÇÕES DE USUFRUTO CANCELAMENTO E CADUCIDADE

ARTIGO INSERIDO NO SITE DA ASSOCIAÇÃO SINDICAL DOS CONSERVADORES DOS REGISTOS


INSCRIÇÕES DE USUFRUTO

CANCELAMENTO E CADUCIDADE


Como muitas vezes tem sido sublinhado, o sistema registral português, cuja organização em serviços próprios – as conservatórias do registo predial – já remonta há mais de século e meio, tem mantido uma qualidade de serviço prestado à comunidade que nunca é demais realçar. Tal deve-se muito à estabilidade dos princípios fundamentais que o enformam.

Mas, mesmo em épocas de prolongada estabilidade jurídica, o sistema registral português não deixou de ser objecto de frequentes alterações, na busca da sempre desejada adaptação das normas adjectivas às novas condições e desafios que o país tem enfrentado. Porém, com excepção do Código de 1928 – onde se chegou a atribuir carácter constitutivo ao registo – as sucessivas alterações que foram introduzidas ao sistema, nunca romperam com a tradição do passado, mas antes reforçaram algumas regras e princípios que conferem maior segurança jurídica ao comércio imobiliário.

Nesta medida, poder-se-á dizer que o Código do Registo Predial de 1984, aproveitando a arrojada dinâmica inovadora de remodelação e modernização contida no Código de 1983, introduziu a mais profunda transformação ao sistema registral português, não só ao nível do enquadramento sistemático das normas, como na adopção de novos princípios que reforçaram o relevo da instituição registral – como o da legitimação de direitos sobre os imóveis –, ou ainda no reforço de alguns princípios emblemáticos do sistema – como o da prioridade – conferindo maior transparência e segurança jurídica ao processo de registo. Mesmo ao nível dos procedimentos, foi extraordinariamente relevante a introdução de novos métodos que se traduziram numa preparação do sistema para a era da informática, que, porém, tarda em concretizar-se.

As alterações posteriores pretenderam sempre conferir maior eficácia e capacidade de resposta aos serviços, que são cada vez mais procurados pelos cidadãos, fruto de um surto de desenvolvimento económico que o país tem vivido na sequência da abertura ao estrangeiro após a revolução democrática de 25 de Abril de 1974, e da posterior adesão à Comunidade Europeia. Por isso, passou a ser preocupação do legislador eliminar a burocracia resultante de procedimentos inúteis – como declaradamente se pretendeu com as alterações ao Código a partir dos anos noventa –, mas também o acolhimento de novas regras, como as recentes alterações sobre a rectificação do registo ou a justificação de direitos sobre imóveis, em que é reforçado o papel da instituição registral na conformação dos interesses dos particulares no que respeita aos direitos sobre os imóveis.








Por isso, consideramos que o Código do Registo Predial é um corpo de normas que se caracteriza por uma permanente dinâmica, no sentido de ser possível a sua conformação às exigências da vida moderna. O estaticismo é inimigo do desenvolvimento e da modernidade.

Esta pequena introdução pretende dar o devido enquadramento a uma questão que nos vem sendo colocada no dia a dia pelos utentes e para a qual confessamos a nossa dificuldade em encontrar uma solução, que não seja a própria alteração do Código.

Como se sabe, uma das alterações mais significativas do Código de 1984 prende-se com o alargamento do instituto da caducidade a determinado tipo de registos que anteriormente a ela não estavam sujeitos (cfr. art. 225,º do Código de 1967). Foi o que aconteceu desde logo com os registos de apreensão, arrolamento e outras providências cautelares, que passaram a caducar decorridos 10 anos sobre a data do registo, e ainda com os de ónus de renúncia à indemnização por aumento de valor e os de ónus de eventual redução das doações sujeitas a colação, que passaram a caducar decorridos 20 anos, respectivamente, a partir da data do registo e da morte do doador (n.ºs 2 e 4 do art. 12.º do CRP, na sua redacção primitiva).

Com a primeira alteração ao Código de 1984, introduzida pelo Decrecto-Lei n.º 355/85, de 2 de Setembro, o legislador foi ainda mais longe, alargando a caducidade a outro tipo de registos antes não contemplados, como os de servidão, de usufruto, uso e habitação e de hipoteca para garantia de pensões periódicas, que passaram a caducar decorridos 50 anos, contados a partir da data do registo.

Evidentemente que, por não estarem antes sujeitos a caducidade, haveria que permitir a possibilidade da renovação de tais registos, o que ficou previsto, quer no Decreto que aprovou o Código de 1984 (vide art. 6.º do Decreto-Lei n.º 224/84, de 6 de Julho), quer no que deu nova redacção ao seu art. 12.º (vide art. 2.º do Decreto-Lei n.º 355/85, de 2 de Setembro).

O registo provisório de acção que antes tinha um prazo de vigência especial (cfr. n.ºs 1 e 2 do art. 180.º do Código de 1967), estava incluído na caducidade de 10 anos, prevista no supra-citado art. 225.º.

Portanto, o legislador entendeu por bem alargar o preceito relativamente à caducidade especial de certo tipo de registos, com o objectivo de expurgar das tábuas muitas inscrições cujos direitos, pelo decurso do tempo, se admite como provável que já não existam.

No caso concreto do usufruto e uso e habitação, presume-se que ao fim de 50 anos já não haverá interesse na permanência do registo, porque eventualmente o seu titular já terá falecido. Mas, no caso de se encontrar vivo, poderá sempre proceder à renovação do registo, o que, confessamos, nunca vimos acontecer, até porque, normalmente, estes direitos são constituídos a favor de pessoas já idosas.




Ora bem, os efeitos do registo destes direitos, de carácter pessoal, extinguem-se, ou por caducidade, nos termos da regra especial do n.º 4 do art. 12.º do Código, ou por cancelamento da respectiva inscrição, conforme se prevê no art. 10.º. Por sua vez, o cancelamento é feito com base na sua extinção ou em decisão judicial transitada em julgado, conforme se diz no art. 13.º.

Na esmagadora maioria dos casos, o usufruto e o uso e habitação são constituídos a favor de pessoa singular e com carácter vitalício. Por isso, o cancelamento das respectivas inscrições é, em regra, feito com base na certidão de óbito do respectivo titular ou em documento equivalente, como, por exemplo, nos parece que poderá ser a escritura de habilitação ou certidão judicial do processo de inventário em que o autor da sucessão seja o titular do direito, pois a morte do usufrutuário é uma das causas de extinção previstas na lei (vide art. 1476.º, n.º 1, alínea a), do Código Civil).

É vulgar acontecer que o usufruto incide sobre determinado prédio que é posteriormente fraccionado, seja através da sua divisão em lotes, seja através da constituição em regime de propriedade horizontal, transferindo-se, assim, a cota de referência da inscrição do usufruto para as novas unidades prediais ou fracções autónomas (vide art. 79.º, n.º 3 do Código). E, nessas situações, a extinção do usufruto, por morte do respectivo titular dá normalmente lugar a tantos cancelamentos parciais quantos os novos prédios ou fracções autónomas a que o chamado prédio-mãe deu origem.

Actualmente (bem ou mal, não interessa aqui discutir), só o titular do direito de propriedade, ou seu mandatário (expresso ou tácito) é que pode requerer aquele cancelamento (cfr. arts. 36.º e 39.º do Código). É certo que a lei fala ainda em todas as pessoas que tenham interesse (no cancelamento), mas esse interesse tem de resultar de qualquer outro registo efectuado sobre o prédio (o credor de hipoteca que pretenda executar o seu crédito, v.g.) ou de documentos que comprovem esse interesse (os herdeiros habilitados do proprietário inscrito que pretendam proceder à partilha do prédio, v.g.).

Ora bem, vejamos então o absurdo da seguinte situação:

A, proprietário inscrito de um prédio, sobre o qual incide uma inscrição de usufruto a favor de B, procede ao registo de autorização loteamento, com o que o prédio é subdividido em dezenas ou centenas de novos prédios (ou mesmo milhares, como já aconteceu na conservatória em que actualmente estamos colocados), vendendo em seguida esses novos prédios, sobre os quais se mantém em vigor a inscrição de usufruto a favor de B. Ocorrendo a morte do usufrutuário, cada um dos proprietários inscritos dos novos prédios terá de proceder ao cancelamento parcial da inscrição de usufruto, relativamente ao seu prédio. O mesmo se dirá do proprietário inscrito de uma fracção autónoma relativa a prédio sobre o qual incida inscrição de usufruto.







Imagine-se agora que, num caso a inscrição de usufruto foi efectuada há 50 anos e um mês e no outro há 49 anos. No primeiro caso, o conservador, face ao decurso do tempo, anota a caducidade da inscrição, nos termos do n.º 4 do art. 12.º do Código, trancando a respectiva cota em todos os prédios sobre que ela incide (citado art. 79.º, n.º 4, do Código). Mas no segundo caso já o mesmo não poderá acontecer, competindo a cada um dos proprietários inscritos dos vários prédios, proceder ao cancelamento parcial, não aproveitando o primeiro cancelamento aos restantes, não obstante a prova de que o direito se acha extinto.

Isto porque, por um lado, há que respeitar a regra do princípio da instância, segundo o qual o registo (só) se efectua a pedido dos respectivos interessados, com excepção dos casos de oficiosidade (cfr. art. 41.º do Código), e por outro lado, só eles têm legitimidade para requerer o cancelamento dos registos que incidem sobre os prédios de que são titulares (citados arts. 36.º e 39.º do Código).

É vulgar acontecer que, feito o primeiro cancelamento, os proprietários inscritos dos restantes prédios nos questionam sobre a necessidade, imposta a todos os restantes interessados, de proceder ao cancelamento parcial de uma inscrição relativa a um direito que se sabe que está extinto há anos.

Como as certidões do registo civil são sempre devolvidas aos interessados, acresce ainda que cada um deles terá de providenciar na requisição de uma certidão de óbito do usufrutuário, não obstante ela já ter sido exibida na conservatória. Isto porque o conservador só pode efectuar os registos à vista dos documentos que legalmente comprovem o respectivo facto (cfr. art. 43.º do Código). Ora, acontece com muita frequência que os interessados não sabem onde faleceu o usufrutuário, e normalmente é a conservatória que fornece os necessários elementos para que ela possa ser obtida. Em todo o caso, não podemos deixar de concordar que se trata de uma daquelas burocratices que legitimamente indignam os utentes.

Para além do mais, parece-nos absolutamente aberrante a necessidade de fazer averbamentos sucessivos de cancelamento parcial da inscrição do usufruto, por morte do respectivo titular, sabendo-se que a pessoa só morre uma vez.

Para os puristas poderá parecer fundamental que, para além das razões derivadas dos princípios da instância e da legitimidade, o cancelamento de uma inscrição só pode ser total com a intervenção dos proprietários de todos os prédios sobre que ela incide, e se forem exibidos os respectivos documentos matriciais, não só porque se impõe a verificação da identidade dos prédios (cfr. art. 68.º do Código), como por razões emolumentares (cfr. art. 21.º n.º 1.2, e n.º 3.3 do RERN, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro).








Julgamos, porém, que não poderão ser regras puramente formais ou de conteúdo emolumentar que justificam a permanência de uma prática tão absurda, como julgamos ter demonstrado. Nem que seja pelo simples facto de que, se a inscrição atingir os cinquenta anos, já não ser necessário requerer nenhum cancelamento nem apresentar qualquer documento matricial, pois então haverá lugar à anotação da caducidade da respectiva inscrição.

Por isso, acolhendo as críticas dos utentes à imposição que deriva das normas do Código nesta matéria, parece-nos ser de adoptar uma solução que permita ultrapassar as dificuldades acima descritas. À falta de uma solução que, interpretando as normas vigentes, permita proceder ao cancelamento total da inscrição de usufruto ou de uso e habitação, quando requerido apenas por um dos diversos proprietários dos prédios envolvidos, com base na extinção do direito por morte do respectivo titular, julgamos que se impõe uma alteração ao próprio Código, eventualmente aditando um n.º 2 ao artigo 13.º, em que poderia ficar consignado o seguinte:

«2 – A prova da extinção, por morte do respectivo titular, dos direitos de usufruto e de uso e habitação, requerida por um dos interessados, implica o cancelamento total da inscrição».

Admitimos, porém, que outras soluções sejam apresentadas, nomeadamente com o recurso à interpretação das normas vigentes. Com o presente contributo apenas queremos abrir o necessário debate. Assim outros se debrucem sobre o tema, provavelmente com outra capacidade interpretativa que, confessamos, não nos ocorre.

Palmela, 25 de Fevereiro de 2003.



O Conservador,




(Vicente João Monteiro)

PROCESSOS ESPECIAIS DE JUSTIFICAÇÃO E DE RECTIFICAÇÃO

ARTIGO INSERIDO NO SITE DA ASSOCIAÇÃO SINDICAL DOS CONSERVADORES DOS REGISTOS


PROCESSOS ESPECIAIS DE JUSTIFICAÇÃO E DE RECTIFICAÇÃO

(Contributo para uma análise do regime das citações e notificações)


NOTA INTRODUTÓRIA

Como todos sabemos, pelo Decreto-Lei n.º 273/2001, de 13 de Outubro, foram introduzidas alterações a vários códigos da nossa área. Na exposição que nos foi proposto fazer, optamos por nos debruçar sobre as alterações ao Código do Registo Predial que é, além de aplicação supletiva aos restantes sistemas de registo, o mais utilizado (até agora não tivemos ainda qualquer processo especial de justificação, e muito poucos de rectificação, no registo comercial).
Do preâmbulo daquele diploma ressalta como primeira linha de força a intenção de prosseguir uma estratégia de «desjudicialização de matérias que não consubstanciam verdadeiro litígio», estratégia que, como também ali se refere, «se enquadra num plano de desburocratização e simplificação processual, de aproveitamento de actos e de aproximação da decisão, na medida em que a maioria dos processos em causa já eram instruídos pelas entidades que ora adquirem competência para os decidir, garantindo-se, em todos os casos, a possibilidade de recurso».
Na área dos registos predial, comercial e automóvel – diz-se também no referido preâmbulo –, mantém-se o processo de justificação notarial previsto na lei do emparcelamento e o processo de justificação administrativa para inscrição de direitos sobre imóveis a favor do Estado, sendo que «o processo de justificação, anteriormente efectuado notarial ou judicialmente ou pelo conservador, passa a ser, em regra, decidido pelo próprio conservador».
Quanto ao processo de rectificação do registo inexacto ou indevidamente lavrado, é de salientar que este passou a ser de instrução e decisão do conservador, mesmo quando estejam em causa direitos de terceiros e não exista acordo.


BREVE ANÁLISE CRÍTICA

Como primeira observação, cabe-nos dizer que se nota neste diploma legal que, ao contrário do que vem acontecendo nos últimos tempos, é evidente a intervenção na sua elaboração de jurista(s) profundamente conhecedor(es) da matéria, uma vez que, quer o preâmbulo, quer o próprio conteúdo das alterações denotam apuro técnico e jurídico, excepção feita a um ou outro ponto, sem grande significado.
Em segundo lugar, impõe-se que se diga que, pessoalmente, consideramos particularmente feliz a ideia de atribuir competência exclusiva ao conservador para decidir sobre a matéria das rectificações, uma vez que, como é natural, é ele quem mais se acha vocacionado para o efeito, quer porque é quem melhor domina a técnica e as disposições legais aplicáveis, quer porque, em grande parte das situações, é ele o primeiro interessado na rectificação. E note-se que o facto de passar a ser ele a decidir, mesmo «quando estejam em causa direitos de terceiros e não exista acordo» é simultaneamente uma prova do reconhecimento da sua competência profissional (sendo a palavra competência aqui empregue no sentido de qualificação) e uma valorização das suas funções, no sentido do reforço daquela ideia que muitos defendem (e poucos reconhecem) de que a actividade do conservador é de conteúdo para-judicial.
Mas – também francamente o afirmamos –, já o mesmo não se poderá dizer da justificação. É que, a pretexto de se prosseguir uma via de desburocratização e de simplificação processual, se criou nas conservatórias um novo Serviço aos utentes, que é um verdadeiro «monstro» de papelada e de «dores de cabeça», sem que simultaneamente tenham sido proporcionados os meios logísticos e humanos para tal, para além de se ter drasticamente aumentado a responsabilidade do conservador sem qualquer contrapartida monetária ou de outra natureza.
Explicando:
Não é que nos assuste o trabalho. Mas é que ele já é tanto que praticamente só nos falta dormir na conservatória.
Também não é que não nos reconheçamos com capacidade e qualificação para a instrução e decisão dos processos de justificação (quantos de nós já se viram forçados a lavrar provisoriamente por dúvidas ou até a recusar o registo de decisões judiciais proferidas em processos de justificação, por falta de observância dos normativos legais aplicáveis, e sobretudo das regras tabulares?). O problema é que nenhuma conservatória está preparada com pessoal suficiente em número e conhecimentos das regras processuais para poder dar andamento correcto e atempado aos processos, restando ao conservador ter de organizar ele próprio todo o processado e elaborar os despachos necessários, tendo ainda que ter particular atenção aos prazos (felizmente poucos) que lhe são impostos.
Também não queremos queixar-nos do baixo salário que muitos de nós auferimos. Mas a questão é que não são só os utentes de fracos recursos económicos e com pouca instrução que se nos dirigem muitas vezes desesperados porque ninguém lhes quer tratar dos assuntos mais complicados e que pouca retribuição proporcionam, mas sobretudo advogados e solicitadores que vêem neste novo processo um meio (aparentemente) mais expedito e barato para resolver os problemas dos seus clientes, muitas vezes sonegando documentos e informação, de modo a evitar uma decisão desfavorável por parte do conservador. No entanto, apesar do brutal acréscimo de trabalho que tais processos acarretaram, não está previsto qualquer tipo de retribuição pessoal para o conservador e para os oficiais envolvidos. E ela bem se justificaria, não só porque grande parte das tarefas desenvolvidas em torno daqueles processos têm de ser executadas fora das horas normais do serviço, como elas envolvem muitas vezes uma vertente de assessoria jurídica, sem a qual muitas das pretensões ficariam condenadas ao indeferimento liminar.
Por último, também não é que queiramos fugir às nossas responsabilidades, pois estamos em crer que todos temos consciência de que nos achamos bem preparados técnica e juridicamente e já estamos habituados a trabalhar sobre brasas e em arame sem rede. Mas a questão é
que se compararmos o nosso estatuto profissional com o dos magistrados judiciais temos de reconhecer que enquanto uma decisão nossa menos correcta ou cujos efeitos impliquem prejuízo para as partes nos pode causar os maiores dissabores, quer do ponto de vista disciplinar, quer do ponto de vista patrimonial, já o mesmo não acontecerá – pelo menos quanto ao segundo aspecto – ao juiz que no exercício da sua actividade profira decisão errada que acarrete prejuízos para os particulares.
Evidentemente que não consideramos errado o estatuto de irresponsabilidade de que o juiz goza, bem pelo contrário, e por razões óbvias. O que nos parece é que, quando o legislador transferiu competências que são próprias de um magistrado judicial para os conservadores, deveria ter averiguado previamente se com isso não estava, não só a sobrecarregar quem passou a ter aquelas competências sem lhes proporcionar os meios adequados, mas sobretudo a criar situações de gritante injustiça, dada a fragilidade das defesas estatutárias de que os conservadores dispõem em caso de ser intentada acção com pedido de indemnização por danos. Fala-se em eventual cobertura da responsabilidade mediante a contratação de seguro de responsabilidade civil. É certo que actualmente já se pode recorrer a esse meio, mas a verdade é que além de ser um meio de protecção dispendioso, continua a ser manifesta a injustiça, porque os magistrados nunca precisaram desse expediente para se acharem a salvo de eventuais pedidos indemnizatórios.
Pode ainda dizer-se que também os notários correm os mesmos riscos que os conservadores. Se bem ajuizamos, não é bem a mesma coisa. É que, por um lado, o notário não está obrigado a celebrar as escrituras de justificação, bastando-lhe invocar que considera que a documentação não se acha em ordem, podendo o utente sempre recorrer a outro notário. Já o mesmo não pode fazer o conservador quando lhe apresentam no Diário um processo de justificação, pois terá sempre, a nosso ver, de proceder à apreciação preliminar e proferir despacho de indeferimento ou determinativo do prosseguimento do processo (cfr. art. 117.º-F do CRP). E, por outro lado, salvo melhor opinião, na escritura de justificação o notário apenas reproduz as declarações dos outorgantes, limitando-se a confirmar que em face dos factos invocados, o justificante adquiriu o direito, enquanto que o despacho final do conservador consiste precisamente no próprio reconhecimento do direito do justificante, que terá ele próprio em seguida de registar. Acresce ainda que a própria lei criou uma situação desvantajosa para os conservadores em termos de exigências formais na medida em que se exije para o acto notarial que os direitos a justificar se achem inscritos na matriz quando dela devam constar (art. 92.º, n.º 1, do Código do Notariado), ao passo que para o processo especial de justificação no registo predial basta que para os mesmos direitos se comprove ter sido pedida a sua inscrição na matriz (art. 117.º-A, n.º 1, do CRP). Esta divergência concorre para que, não podendo recorrer à escritura de justificação em virtude dos prédios a justificar constituírem partes de artigos, os interessados instaurem o processo de justificação no registo predial invocando a usucapião fundada na posse, apresentando apenas a correspondente participação de discriminação cadastral, normalmente formando prédios rústicos com áreas inferiores à unidade mínima de cultura, referindo desde logo no requerimento que a constituição de tais prédios sem o prévio parecer favorável do respectivo departamento governamental é meramente anulável conforme vem sendo firmado pela jurisprudência.
Sobre esta matéria muito mais haveria a dizer, mas sendo esta exposição apenas uma abordagem muito sintética e relativa somente a alguns aspectos dos processos de justificação e de rectificação, ficamos por aqui, deixando para ocasião mais apropriada uma análise mais desenvolvida.


PROCEDIMENTOS QUE ENVOLVEM CITAÇÕES E NOTIFICAÇÕES

1. No processo especial de justificação

O requerimento, elaborado nos termos do n.º 2 do art. 117.º-B, acompanhado dos documentos previstos nas diversas alíneas do art. 117.º-C, e ainda dos necessários à verificação dos pressupostos da procedência do pedido, e indicação das testemunhas, até ao máximo de cinco, é apresentado no Diário, sendo devido preparo no valor dos emolumentos previstos no RERN pelo processo e pelos actos de registo a lavrar (art. 117.º-D).
Começando precisamente pela matéria relativa ao preparo, sublinha-se que, conforme resulta dos n.ºs 2 e 3 do art. 117.º-D, deve ser exigido o pagamento de preparo no momento da apresentação do pedido de instauração do processo. Pode, contudo, acontecer, que, ou os documentos sejam apresentados pelo correio sem a remessa do correspondente preparo (vide n.º 1 do art. 65.º), ou o apresentante não venha prevenido para pagar o preparo, insistindo, no entanto, na apresentação do pedido. Em tais casos, à semelhança do que já se acha previsto para os actos de registo em geral (vide alínea c), do n.º 1, do art. 66.º), deve ser rejeitada a apresentação no Diário, devolvendo-se os documentos com despacho do conservador, despacho este que é susceptível de recurso (vide n.º 3 do citado art. 117.º-D).
A lei não o diz, mas julgamos que este despacho deve ser formalmente notificado ao apresentante, tendo em vista a contagem do prazo para a impugnação prevista naquela última norma. Assim, no caso de apresentação pelo correio, julgamos que deve ser feita uma notificação nos termos previstos no art. 71.º, devendo ainda a nosso ver, sendo possível, quer a devolução dos documentos quer a remessa da notificação ser imediatos, isto é, no próprio dia ou no dia seguinte ao da rejeição da apresentação. No caso da apresentação ser feita pessoalmente na conservatória parece-nos que o despacho deve ser proferido de imediato e entregue ao apresentante, que por sua vez deverá rubricar e datar um duplicado desse despacho para constituir prova da notificação.
Depois de efectuada a apresentação, é lavrado averbamento oficioso de pendência da justificação, abrindo-se para o efeito a descrição do prédio, se este não estiver descrito ou for a desanexar de outro já descrito, seguindo-se os demais procedimentos previstos no art. 117.º-E do CRP. Conforme se acha previsto nos n.ºs 3 e 5 do citado art. 117.º-E, no caso de ser proferido despacho de indeferimento do pedido ou que declare o processo findo, procede-se ao cancelamento do averbamento da pendência da justificação e inutiliza-se a descrição que para o efeito tenha sido aberta, logo que a respectiva decisão se torne definitiva.
O art. 117.º-F regula o procedimento a tomar após a apresentação do pedido de instauração do processo de justificação, devendo, a nosso ver, o conservador proferir sempre despacho, quer ele seja de indeferimento liminar, quer ele seja de aperfeiçoamento do processo, nomeadamente com o convite dirigido ao requerente da justificação para juntar os documentos julgados necessários à apreciação do pedido ou de prestação de declarações complementares, quer ele seja de deferimento, caso em que se limitará a fazer uma breve apreciação preliminar, determinando em seguida o prosseguimento do processo. Quanto ao preceito relativo à apreciação preliminar do pedido julga-se pertinente fazer as seguintes observações:
Em primeiro lugar, coloca-se a questão de saber se o processo deve ser tratado como um pedido de registo normal, para efeitos de qualificação (nomeadamente colocando-o na ordem dos restantes processos de registo), ou se, pelo contrário, deve ser desde logo objecto de apreciação separada por parte do conservador. A lei não prevê qualquer prazo para a apreciação a que chamamos de preliminar, por isso julgamos que, no caso de se tratar de prédio já descrito, pode o conservador proceder desde logo à apreciação, verificando, evidentemente, se não estão apresentados outros actos de registo anteriores sobre o mesmo prédio susceptíveis de alterar essa apreciação. Mas, no caso de ter de ser aberta uma descrição, então essa apreciação deverá ser feita dentro da ordem dos registos. Porém, também achamos que no caso de o volume de serviço e a complexidade do processo não permitirem uma apreciação criteriosa imediata, poderá a abertura da descrição não ser feita de imediato. De qualquer modo, neste último caso, apenas o número da descrição poderá eventualmente ficar fora da ordem normal, pois a data será sempre a da apresentação do pedido. Ficará, pois, sempre salvaguardada a prioridade dos actos, já que os que forem apresentados posteriormente se lhe seguirão necessariamente.
Em segundo lugar, sendo proferido despacho de indeferimento liminar, deve o requerente da justificação ser notificado, para efeitos de eventual recurso, a processar nos termos do art. 117.º-I, que adiante se analisará.
Em terceiro lugar, parece-nos que do despacho em que o conservador convida o requerente da justificação para juntar os documentos julgados necessários ou a prestação de esclarecimentos e declarações complementares, não cabe recurso. Achamos, no entanto, que o despacho deve ser notificado nos mesmos termos, até para efeitos de contagem do prazo de 10 dias previstos na lei para a junção dos documentos e prestação das declarações complementares (vide n.º 2 do citado art. 117.º-F).
Em quarto lugar, deve ser ponderada a hipótese de o prazo de 10 dias previsto na lei ser insuficiente para o requerente da justificação proceder à reunião de todos os documentos. Tal hipótese não é meramente académica, pois já nos aconteceu por diversas vezes que o requerente da justificação, invocando precisamente dificuldades na obtenção dos documentos, nos solicitou a prorrogação do prazo e a sua fixação num período mais dilatado. O Código não refere esta eventualidade, pelo que à partida seríamos levados a concluir que não é possível a prorrogação do prazo previsto no citado art. 117.º-F, n.º 2. Contudo, aplicando ao processo especial de justificação os princípio gerais do processo civil (art 117.º-P do CRP), parece-nos que não haverá inconveniente em ser deferido o pedido de prorrogação do prazo para apresentação dos documentos. No âmbito do processo judicial é ao respectivo juiz que cabe o poder de direcção do processo (art. 265.º, n.º 1 do CPC), podendo dizer-se que o mesmo poder é deferido ao conservador no caso do processo especial de justificação.
A propósito da petição inicial, Antunes Varela diz que «o juiz pode (e em certos casos deve) …convidar o autor a completá-la ou corrigi-la», nomeadamente «quando a acção não possa prosseguir pelo facto de a petição não vir acompanhada de certos documentos», é o chamado princípio da cooperação, previsto no art. 266.º do CPC, que em sede de processo não litigioso ainda mais se compreende. E, valha a verdade, diz-nos a prática que o prazo de 10 dias em certas circunstâncias é claramente insuficiente (pense-se, por exemplo, na eventualidade do requerente da justificação ser convidado a juntar uma certidão de casamento de alguém que casou nos Estados Unidos da América ou na Austrália).
Em quinto lugar, face à interposição de recurso da decisão de indeferimento liminar, que deve ser apresentado na conservatória (vide n.º 4 do art. 117.º-I), o conservador toma uma de duas atitudes: ou repara a decisão e profere despacho fundamentado em que conclui por determinar o prosseguimento dos termos do processo, notificando o recorrente (n.º 4 do citado art. 117.º-F), ou mantém a sua decisão e procede à citação prevista no art. 117.º-G e simultaneamente à notificação da interposição do recurso.
Tem-se questionado a razão de ser desta última exigência. Na verdade se é compreensível a necessidade da notificação do despacho de sustentação do indeferimento, tendo nomeadamente em vista dar a conhecer ao requerente da justificação a remessa do processo ao tribunal, já pode parecer estranho que tenha de se proceder à citação do Ministério Público e dos interessados (certos e incertos), bem como dos eventuais titulares inscritos.
A nossa opinião é de que estes procedimentos se justificam na medida em que, com a remessa do processo ao tribunal para apreciação do recurso, e no caso do tribunal julgar procedentes os fundamentos do recorrente, o processo passa para a alçada do tribunal, que lhe dará o seguimento que julgar adequado. Em tal caso, ganha-se tempo, uma vez que quando o processo é remetido ao tribunal já vai instruído com as citações legais, bem como com a notificação de todos os interessados (certos e incertos) de que o pedido foi liminarmente indeferido na conservatória e que o indeferimento foi objecto de impugnação. Repare-se que, conforme se acha previsto no n.º 6 do citado art. 117.º-F, se, na sequência das citações legais, alguém deduzir oposição ao pedido, o processo é dado por findo, sendo os interessados remetidos para os meios judiciais, e só no caso de não haver oposição é que o processo é remetido ao tribunal que, a partir de então, do nosso ponto de vista, passará a ter competência exclusiva para decidir sobre o seu destino.
Vejamos agora os procedimentos posteriores à apreciação preliminar. Vamos partir do princípio que não houve indeferimento, pelo que, nos termos do art. 117.º-G, se passa à fase das citações. Como se refere no n.º 1 daquela norma, para os termos do processo são citados o Ministério Público junto do Tribunal Judicial da área da conservatória, e os interessados incertos. No n.º 2 do mesmo preceito refere-se que no caso da justificação se destinar ao reatamento ou ao estabelecimento de novo trato sucessivo, é também citado o titular da última inscrição quando se verificar falta de título em que ele tenha intervindo, procedendo-se à sua citação edital ou à dos seus herdeiros, independentemente de habilitação, quando ele se ache ausente em parte incerta ou tenha falecido.
Entendemos que a citação do Ministério Público e dos interessados certos é feita nos termos gerais com a remessa de cópia da petição, sendo que, nos termos do n.º 3 do citado preceito legal, a citação dos interessados incertos é feita pela afixação de editais, pelo prazo de 30 dias, na conservatória e na sede na Junta de Freguesia da área do prédio.
Muitas vezes o requerente da justificação deduz o pedido contra determinadas pessoas. Por exemplo, invocando que lhes comprou o direito em causa ou com elas dividiu o prédio de que tem a posse, ou comprovando por escritura de habilitação quem são os herdeiros do titular inscrito, de quem adquiriu. É óbvio que nesses casos os requeridos são interessados certos que terão de ser citados nos mesmos termos em que se cita o Ministério Público ou o titular inscrito, nomeadamente remetendo-se-lhes cópia do requerimento da justificação.
No n.º 4 do citado art. 117.º-G, refere-se que o titular inscrito ausente ou incapaz que, por si ou seus representantes, não tenha deduzido oposição, é defendido pelo Ministério Público que para o efeito deve também ser citado. Significa isto que, além da citação prevista no n.º 1 do mesmo preceito legal – em que cremos que a citação do Ministério Público tem como fim a defesa da legalidade e dos interesses do Estado – pode ter que ser feita nova citação àquela entidade, quando se venha a verificar que o citado se encontra ausente em parte incerta ou é incapaz (vide também o n.º 5 do art. 117.º-G). Naturalmente, quando o requerente da justificação refere que o requerido a citar se acha ausente em parte incerta, ou que já é falecido e se desconhecem os seus herdeiros, ou ainda que o mesmo sofre de alguma incapacidade, pode/deve a citação ao Ministério Público fazer logo referência a esse facto, considerando-se, desse modo, feita a citação prevista nos n.ºs 1 e 4 e 5 do citado art. 117.º-G.
O Ministério Público e qualquer outro interessado podem deduzir oposição à justificação, nos dez dias subsequentes ao termo do prazo de 30 dias em que os editais permanecem afixados na conservatória e na Junta de Freguesia (n.º 1 do art. 117.º-H), devendo, por isso, quer nas citações pessoais – por carta registada com aviso de recepção nos termos previstos no CPC (vide art. 117.º-P e BRN n.º 2/2003, pág. 7) – quer nos próprios editais ser expressamente referido que o pedido da justificação pode ser impugnado naquele prazo. Conforme se refere no n.º 2 do citado preceito, se houver oposição, o conservador declara o processo findo, remetendo os interessados para os meios judiciais.
Põe-se a questão de saber quem e em que termos pode deduzir oposição à justificação. Quanto a nós, basta que o Ministério Público comunique à conservatória por ofício que se opõe ao pedido, seja em nome próprio, seja em nome de interessado ausente ou incapaz, para que se considere que houve oposição. Quanto aos restantes interessados, pensamos que qualquer pessoa pode igualmente apresentar oposição por escrito na conservatória, uma vez que a própria lei diz que são citados os interessados incertos para deduzir oposição. Apenas nos resta uma dúvida: será que, quer o Ministério Público, quer os interessados (certos e incertos), devem fundamentar a sua oposição ao pedido? Pode realmente acontecer que a oposição não seja baseada em factos ou circunstâncias consideradas plausíveis. Que fazer então? Pessoalmente consideramos que havendo oposição, desde que por escrito, deve o conservador dar o processo por findo, remetendo os interessados para os meios judiciais, pois não lhe cabe a ele avaliar os termos ou os fundamentos da oposição. E em que consiste a remessa para os meios judiciais? Do nosso ponto de vista, deve o conservador proferir um despacho de arquivamento do processo, referindo que, face à oposição ao pedido, o processo passa a ter carácter litigioso, pelo que só o tribunal é competente para decidir sobre a questão controvertida, onde os interessados poderão instaurar a competente acção. Obviamente aquele despacho terá de ser notificado ao requerente, tendo em vista a possibilidade da sua impugnação, conforme parece resultar da conjugação do citado n.º 2 do art. 117.º-H com o n.º 5 do art. 117.º-G, ambos do CRP.
Nos termos dos n.ºs 3 e 4 do referido art. 117.º-H, não havendo oposição à justificação, passa-se à fase da inquirição das testemunhas, cujos depoimentos são reduzidos a escrito. A decisão final é proferida no prazo de 10 dias, após a conclusão da instrução, nela se especificando os actos a efectuar, com referência às respectivas causas e à identidade dos correspondentes sujeitos.
Como se vê, a lei apenas fixou prazo para a decisão final, após a conclusão da instrução do processo. Isto significa que o conservador não está vinculado a cumprir qualquer prazo até à conclusão da fase de inquirição das testemunhas. Não deve, evidentemente, prolongar a resolução do processo por tempo indefinido, mas, por exemplo, a marcação da data da inquirição das testemunhas depende apenas da sua disponibilidade, não podendo os interessados reagir contra a data que for fixada pelo conservador.
Outro aspecto que interessa analisar é saber se as testemunhas terão que prestar todas o seu depoimento no mesmo dia. A lei nada diz sobre o assunto pelo que se, na sequência da sua notificação para comparecer na conservatória em determinado dia, alguma ou algumas delas comunicarem ao conservador que não podem comparecer nesse dia, julgamos que nada obsta a que sejam ouvidas as testemunhas presentes, marcando o conservador um outro dia para a audição das que não puderem comparecer.
A decisão final é notificada ao Ministério Público e aos interessados, no prazo de cinco dias a contar da data da decisão. Não havendo impugnação da decisão, o conservador lavra oficiosamente os respectivos registos (nºs. 4 e 5 do mesmo art. 117.º-H).
Decorrido o prazo sem que se verifique a existência de impugnação, julgamos que deve o conservador proferir despacho determinativo dos registos, despacho que será proferido sem sujeição a prazo. Na verdade, estando agora a usucapião sujeita ao pagamento de imposto de selo (cfr. alínea a) do n.º 3 do art. 1.º, alínea r) do art. 5.º, e n.º 1 do art. 26.º do Código do Imposto de Selo, e ponto 1.2 da respectiva Tabela), consideramos que só após a prova de que está instaurado o respectivo procedimento poderão os registos ser lavrados com carácter definitivo. Que fazer então se o interessado não comparecer a apresentar aquela prova? A lei não refere qualquer outro procedimento posterior à decisão final que não seja impugnada, pelo que, pessoalmente consideramos que no despacho final deve agora fazer-se referência ao facto de que, tornando-se a decisão definitiva, os registos serão oficiosamente lavrados logo que seja comprovado que se acha pago ou instaurado o procedimento para o pagamento do selo devido pela usucapião. Como é evidente, apenas no caso de ser invocada a usucapião como causa de alguma das aquisições é que haverá lugar ao pagamento de imposto de selo, o que não acontecerá no caso de o processo de justificação se destinar ao reatamento do trato sucessivo tendo em vista suprir a falta de um título relativo a uma transmissão derivada intermédia. Neste caso há que ter em vista o que se determina no art. 117.º, nomeadamente no seu n.º 2. Como é evidente, se o interessado não comprovar que foi iniciado o procedimento para liquidação do imposto de selo, o registo não poderá ser efectuado com carácter definitivo (vide art. 72.º do CRP, e 42.º, e 54.º do Código do Imposto de Selo). Por isso, pensamos que o despacho acima referido deve desde logo fixar o prazo para que se comprove que está assegurado o cumprimento das obrigações fiscais, sob pena do registo ser lavrado provisoriamente por dúvidas.
O despacho que nós chamamos de «despacho determinativo do registo», ainda que condicionado à prévia prova do cumprimento das obrigações fiscais, deverá, pois, também ser notificado ao requerente da justificação, nomeadamente para lhe ser permitido proceder às diligências necessárias, evitando que o registo venha a ser lavrado por dúvidas.
Naturalmente, desse despacho não cabe recurso, por tal não estar previsto. Na altura em que foi aprovado o Dec.-Lei n.º 273/2001 a usucapião não estava tributada em qualquer imposto, nem evidentemente se podia prever que viesse a estar tributada em imposto de selo. Parece-nos, pois, que o requerente da justificação apenas poderá recorrer do despacho que tenha qualificado o registo como provisório por dúvidas por falta de prova do cumprimento das obrigações fiscais nos termos gerais, previstos nos arts. 140.º e seguintes do CRP.
A decisão final – que tanto pode ser de deferimento do pedido como de indeferimento – pode ser impugnada mediante recurso para o tribunal competente, no prazo de 10 dias a contar da notificação (vide n.ºs 1 e 2 do art. 117.º-I do CRP e 685.º do CPC). O recurso é interposto mediante requerimento fundamentado apresentado na conservatória, após o que é remetido ao tribunal.
Como notas finais cabe-nos ainda fazer as seguintes observações:
Não está prevista a possibilidade reparação da decisão, pelo que deve o conservador sopesar todas as consequências antes de proferir a decisão final. Apenas os interessados e o Ministério Público podem recorrer da decisão do tribunal de 1.ª instância (vide n.º 1 do art. 117.º-L), sendo este facto mais uma prova de que, passando o processo para o tribunal, seja qual for o estado em que se encontre, deve ser o respectivo juiz a decidir sobre a sua sorte, designadamente proferindo a própria decisão final que, no caso de não ser coincidente com a do conservador, deve determinar a realização do registo, quer tenham ou não sido aproveitados os seus procedimentos anteriores.
O processo é devolvido à conservatória após o trânsito em julgado da respectiva sentença ou do acórdão proferidos (art. 117.º-M), devendo o conservador proceder aos registos no caso de procedimento da impugnação, nos termos previstos no n.º 6 do art. 117.º-H.
No caso de a justificação não ter sido deferida, não ficam os interessados impedidos de instaurar novo processo, nomeadamente apresentando provas complementares ou novas testemunhas (art. 117.º-N).
Pode também ser instaurado processo de justificação para suprimento da falta de documento para o cancelamento de quaisquer ónus ou encargos, aplicando-se-lhe as disposições relativas ao processo de justificação para primeira inscrição, naturalmente com as devidas adaptações (art. 118.º).


2. Nos processos de rectificação

Das alterações introduzidas ao Capítulo das rectificações, apenas nos debruçaremos sobre os aspectos mais relevantes, uma vez que, do ponto de vista dos procedimentos, pouco de substantivo se modificou. Assim, cabe em primeiro lugar relembrar que a decisão sobre o pedido de rectificação passou a ser da exclusiva competência do conservador, dela cabendo recurso para o tribunal de 1.ª instância (art. 131.º). Deixou, pois, de haver duas modalidades de rectificação: por requerimento dos interessados e em conferência promovida pelo conservador (art 125.º do CRP na sua redacção anterior), continuando, no entanto, a rectificação a ser requerida pelos interessados ou promovida oficiosamente pelo conservador (n.º 1 do art. 121.º). Verificando-se que a rectificação foi pedida por todos os interessados, que fazem a prova dos factos invocados, se o conservador concordar que o registo se acha errado, determina desde logo a rectificação (art. 124.º). Quando a rectificação não seja susceptível de prejudicar direitos dos titulares inscritos é efectuada mesmo sem necessidade do seu consentimento, quando a inexactidão seja proveniente da desconformidade com o título, ou, provindo o erro do título, se a rectificação for requerida por qualquer interessado com base em documento bastante (art. 125.º).
São inúmeros os casos de aplicação desta última regra, cabendo ao conservador analisar, caso a caso, se os documentos apresentados são ou não bastantes para a prova da existência de erro e para a possibilidade da sua rectificação.
Conforme se diz no n.º 1 do art. 126.º, apenas no caso da rectificação não poder ser efectuada nos termos acima referidos é que se passa à fase de instrução de processo especial, sendo então averbada ao registo a pendência de rectificação, com referência à anotação no Diário do requerimento inicial do interessado ou ao auto de verificação da inexactidão levantado pelo conservador. Conforme se diz no n.º 4 do referido art. 126.º, o averbamento da pendência de rectificação é oficiosamente cancelado no caso de indeferimento do pedido de rectificação ou na sequência de qualquer outro despacho que declare o processo findo.
Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art. 127.º, sempre que o pedido se mostre manifestamente improcedente, o conservador profere despacho de indeferimento liminar, que deve ser devidamente fundamentado, pois dele cabe recurso para o tribunal de 1.ª instância. Na sequência do recurso, que é apresentado na conservatória, pode o conservador reparar a sua decisão, mandando prosseguir os termos do processo (n.º 3 do citado art. 127.º), ou manter a decisão de indeferimento remetendo o processo ao tribunal. Neste caso, procede-se previamente à citação dos interessados, nos termos do art. 129.º, os quais poderão igualmente impugnar os fundamentos do recurso, no prazo de 10 dias (n.º 4 do mesmo art. 127.º).
É frequente verificar-se que os interessados pretendem efectuar uma rectificação, requerendo, embora, um mero averbamento de alteração (da descrição ou da inscrição), pagando apenas o preparo correspondente a esse averbamento. Como é evidente, se a rectificação não for efectuada nos termos dos arts. 124.º ou 125.º, mas não for também proferido despacho de indeferimento liminar, além dos actos a efectuar, há também lugar à cobrança do emolumento devido pelo processo especial de rectificação. Nesse caso, procede-se à notificação dos interessados para pagamento, no prazo de 5 dias, dos emolumentos em falta. O custo será agravado em 20%, se o pagamento for feito após os 5 dias previstos e antes de decorridos mais 8 dias, findos os quais o processo é declarado por findo se o pagamento não tiver sido efectuado (art. 128.º).
Conforme se estipula no art. 129.º, no caso de haver interessados não requerentes, o conservador ordena a sua citação para, no prazo de 10 dias, deduzirem oposição à rectificação oferecendo as provas que considerem adequadas. Se houver interessados incertos procede-se também à citação do Ministério Público. Não sendo possível a citação pessoal de algum dos interessados, por ausência ou falecimento, procede-se ainda à sua citação ou dos respectivos herdeiros, independentemente de habilitação, mediante a afixação de editais, pelo prazo de 30 dias, na conservatória e na Junta de Freguesia da última residência conhecida dos interessados, constando dos editais os elementos essenciais do processo. Tal como no processo de justificação, a defesa dos ausentes e incapazes que, por si ou seus representantes, não tenham deduzido oposição, incumbe ao Ministério Público que para o efeito deve ser citado.
Ao contrário do que ocorre no âmbito do processo de justificação, no caso de haver oposição, o conservador pode não dar o processo por findo remetendo os interessados para os meios judiciais. Ao conservador cabe agora sempre decidir se a rectificação deve ou não ser efectuada ainda que tenha havido oposição de algum interessado, pelo que, no respectivo despacho, evidentemente devidamente fundamentado, deve ser feita referência expressa à existência de oposição à rectificação. Como se verá, os interessados têm sempre ao seu dispor a possibilidade de interpor recurso judicial da decisão.
Conforme resulta do art. 130.º, se tiver sido requerida a produção de prova, o conservador ordena, no prazo de cinco dias, as respectivas diligências, sendo os depoimentos das eventuais testemunhas reduzidos a escrito. No caso de ser necessário proceder a perícias, elas deverão ser requisitadas pelo conservador, que, caso seja necessário, nomeia perito nos termos previstos no art. 568.º do CPC. Em qualquer caso, o conservador pode ordenar as diligências que julgar necessárias tendo em vista a formulação de um juízo consciencioso sobre o pedido de rectificação. Após a conclusão da produção das provas e das diligências ordenadas pelo conservador, dispõem ainda os interessados de três dias para produzir as alegações que acharem convenientes. Uma vez que o conservador terá de proferir a decisão final no prazo de 10 dias após a conclusão da instrução do processo, achamos conveniente que os interessados sejam expressamente notificados para efeitos de apresentação das alegações a que se refere o n.º 5 do citado art. 130.º.
A decisão final do conservador deve ser notificada ao requerente, bem como aos restantes interessados, tendo em vista a possibilidade de impugnação, prevista no n.º 1 do art. 131.º. A este propósito, refira-se que, do nosso ponto de vista, esta notificação deverá também ser feita ao Ministério Público, mas apenas quando o mesmo tenha sido citado nos termos do n.º 2 do art. 129.º, ou seja, se houver interessados incertos, que por ele são defendidos.
O prazo para o recurso, a interpor na conservatória, é o previsto no art. 685.º do CPC e tem efeito suspensivo (art. 131.º). Conforme se prevê expressamente no art. 132.º-A, o conservador, como interessado directo que é no processo de rectificação, pode sempre recorrer da decisão proferida em 1.ª instância, bem como para o Supremo Tribunal de Justiça, quando o mesmo for admissível. Após o trânsito em julgado da decisão, o processo é devolvido à conservatória, quer seja ou não de efectuar a pretendida rectificação.
Como notas finais, cabe-nos ainda dizer o seguinte:
Como resulta da lei, o conservador tem a completa condução do processo, podendo ordenar as diligências que julgar necessárias, não podendo os interessados deixar de lhes dar cumprimento. É evidente que as diligências terão de ser razoáveis e adequadas à formulação de um juízo correcto sobre a rectificação, não podendo o conservador fazer exigências absurdas ou impossíveis de realizar.
No processo de rectificação não prevê a lei que o conservador possa proferir despacho de reparação quando tenha sido interposto recurso da decisão de indeferimento. O que se compreende, pois sendo de sua exclusiva responsabilidade a decisão final, esta só poderá/deverá ser proferida quando o conservador se ache na posse de todos os elementos necessários para uma decisão conscienciosa, que não poderá depois alterar.
Mas, por outro lado, compreende-se que, ao contrário do que ocorre no processo de justificação, o conservador possa recorrer das decisões judiciais proferidas no âmbito do processo de rectificação, considerando que a decisão final é de sua exclusiva competência. Como é natural, a decisão do conservador, neste como em qualquer outro caso de actos de registo em geral, não faz «caso julgado», podendo sempre ser alterada. Mas, ao contrário do que ocorre com os actos de registo em sentido próprio, da decisão de indeferimento da rectificação não cabe recurso hierárquico, pelo que a sua decisão apenas pode ser alterada mediante decisão judicial com trânsito em julgado.
Por último, tal como também ocorre no âmbito do processo de justificação, após o trânsito em julgado da decisão judicial proferida no recurso, o processo é devolvido à conservatória, devendo evidentemente a rectificação ser efectuada se tiver sido dado provimento ao recurso, ainda que o conservador a ela se tenha oposto (art.132.º-B).

Palmela, 17 de Maio de 2004.

O conservador,

(Vicente João Monteiro)


quarta-feira, abril 26, 2006

É devida taxa de publicidade pelos advogados por terem afixada placa na parede frontal do edifício onde têm instalado o seu escritório de advocacia?

Decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé sobre Placas de Escritórios de Advogados

TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE LOULÉ


Impugnação judicial n.0 ...
Conclusão: ...



I - Relatório


O Ilustríssimo Advogado Sr. Dr. ... veio impugnar a liquidação de taxa de publicidade efectuada pela Câmara Municipal de ..., pedindo que o acto seja anulado e alegando, em síntese, os seguintes factos:
Ao Impugnante foi exigido pela Câmara Municipal de ... o pagamento da quantia de € 9,92 (nove euros e noventa e dois cêntimos) a título de taxa de publicidade relativa ao ano de 2004.
O pagamento da taxa deveria ter sido efectuado até ao final do mês de Maio do corrente ano.
A dita taxa seria devida pelo facto de o ora Impugnante ter afixada placa na parede frontal do edifício onde tem instalado o seu escritório de advocacia (Rua ...), a que na notificação se atribui erroneamente a dimensão de 23 m2.
O ora Impugnante por entender a tal não estar obrigado legalmente, não pagou aquela importância reclamada pela Câmara Municipal de ... a título de taxa.
A placa em referência tem as dimensões de 25 cm x 75 cm e está confeccionada em material acrílico emoldurado.
Apresenta os seguintes dizeres em branco, sobre fundo preto: ".../ADVOGADO".
O prédio urbano onde se encontra aposta aquela placa é propriedade de ..., e encontra-se inscrito na respectiva matriz predial da freguesia de ... sob o art.º ... e descrito na Conservatória do Registo Predial competente sob n.º ... e aí inscrito definitivamente a favor do seu aludido proprietário, pela inscrição ....
A instalação da já referida placa foi precedida do respectivo licenciamento camarário, tendo sido paga pelo ora Impugnante a quantia por isso alegadamente devida em função do Regulamento Municipal (REGULAMENTO DE LICENÇAS PARA ANÚNCIOS DE RECLAMOS, aprovado em sessão ordinária da Câmara Municipal de ..., em ... e pelo Conselho Municipal em ...).
Tal licenciamento definitivo verificou o cumprimento, por parte do impugnante, das normas do citado Regulamento, designadamente a inserção daquela placa na arquitectura e na paisagem urbanísticas e bem assim as condições de segurança.
Desde esse acto de licenciamento a Câmara Municipal de ... nunca mais prestou qualquer serviço ou disponibilizou qualquer bem relacionado com a referida placa.

Liminarmente admitida a impugnação, foi notificado o Exmo. Representante da Fazenda Pública para contestar, o que fez, de forma douta, como e seu timbre, pugnando pela sua improcedência, alegando, em resumo:
O Impugnante dispõe de uma placa publicitária afixada na parede frontal do edifício sito na Rua ..., local onde tem instalado o seu escritório de advocacia.
Nessa placa tem afixado os seguintes dizeres: «.../Advogado».
0 Município de ... não referiu em momento algum que a placa tivesse 23m2, conforme alega o Impugnante na sua impugnação.
O valor cobrado pela afixação da placa corresponde as dimensões aproximadas de 0,23m2.
Este valor foi cobrado por o Impugnante manter a referida placa publicitária afixada, dando a conhecer ao público a actividade liberal ali exercida.
Nos termos do art.º 1.º n.º 5 b) do Regulamento de Licenças para Anúncios e Reclames, em vigor no Município de ..., a afixação, colocação ou utilização de publicidade está sujeita a licença da Câmara Municipal e ao pagamento das respectivas taxas.
Nos termos do art.º 11.º do citado Regulamento a licença concedida pela Câmara Municipal e renovada anualmente, nos meses de Janeiro a Março.
No ano de 2004 foi excepcionalmente cobrada até ao final do mês de Maio, devido a substituição do programa informático de cobrança das taxas de publicidade.
Pela afixação da publicidade é devida a taxa de € 8,27 por m2 de placa, nos termos do art.º 44.º n.º 1 da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município, em vigor no ano de 2004, acrescida do devido imposto de selo.
As taxas por afixação de publicidade são devidas sempre que os anúncios se divisem da via pública, conforme observação n.º 1 ao art.º 44.º da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município.


Os autos foram então a parecer do Ministério Público, tendo a EMMP defendido a procedência do pedido.
Cumpre agora apreciar e decidir.

II- Fundamentação


1. Factos provados
Ao Impugnante foi exigido pela Câmara Municipal de ... o pagamento da quantia de € 9,92 (nove euros e noventa e dois cêntimos) a título de taxa de publicidade relativa ao ano de 2004.
O pagamento da taxa deveria ter sido efectuado até ao final do mês de Maio do corrente ano.
A dita taxa seria devida pelo facto de o ora Impugnante ter afixada placa na parede frontal do edifício onde tem instalado o seu escritório de advocacia (...), a que na notificação se atribui erroneamente a dimensão de 0,23 m2.

2. Factos não provados
A dita taxa seria devida pelo facto de o ora Impugnante ter afixada placa na parede frontal do edifício onde tem instalado o seu escritório de advocacia (Rua ...), a que na notificação se atribui erroneamente a dimensão de 23 m2.


3. Fundamentação do julgamento
A decisão da matéria de facto fundou-se no processo administrativo apenso e no acordo das partes.


4. A questão a resolver
Importa apreciar e resolver a seguinte questão:
É devida taxa de publicidade pelos advogados por terem afixada placa na parede frontal do edifício onde têm instalado o seu escritório de advocacia?

5. Pressupostos processuais
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo, que é o próprio, não enferma de nulidade total.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias e tem legitimidade.
Inexistem outras excepções dilatórias, nulidades ou outras questões prévias além da que se aprecia e que obstem a apreciação do mérito da causa e de que cumpra conhecer.

6. Mérito da causa
Os n.º 1 e 4 do art.º 80.º do Estatuto da Ordem dos Advogados em vigor no ano de 2004 (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março de 1984), estatuía o seguinte:
«1. É vedada ao advogado toda a espécie de reclamo por circulares, anúncios, meios de comunicação social ou qualquer outra forma, directa ou indirecta, de publicidade profissional, designadamente divulgando o nome dos seus clientes.
(...)
4. Não constitui também publicidade o uso de tabuletas afixadas no exterior dos escritórios, a inserção de meros anúncios nos jornais e a utilização de cartões de visita ou papel de carta, desde que com simples menção do nome do advogado, endereço do escritório e horas de expediente.»
Assim sendo, uma vez que o uso da tabuleta em causa não constitui legalmente um acto de publicidade, parece claro que não pode a Câmara Municipal de ... pretender cobrar uma taxa que só seria devida caso assim pudesse ser considerado (não devendo esquecer-se que a unidade do sistema jurídico impõe a leitura integrada das normas e, por conseguinte, também daquelas que aqui nos ocuparam).
Por tudo o que atrás se referiu também resulta que se mostra despiciendo analisar a vexata questio jurisprudencial da qualificação da referida taxa de publicidade como verdadeira taxa ou imposto e, neste último caso, da sua conformidade constitucional (por não ter sido criada por lei), pelo que passaremos desde já à decisão.


III - Decisão
Face ao exposto, julgo a presente impugnação judicial procedente e, em consequência, anulo a liquidação da taxa em causa nos autos.
Custas pela Fazenda Pública (a Câmara Municipal de ...; art.º 446.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil).

Registe e notifique.

Loulé,